Para nações mais pobres, só comércio não resolve

Só comércio não é suficiente. A conclusão partiu da mesa-redonda sobre estratégias de desenvolvimento promovida ontem pelas delegações dos países mais pobres do mundo durante a 11ª Unctad.
Em uma seqüência de discursos inflamados -que terminaram por atrasar em 20 minutos o final do encontro-, os representantes desses países enfatizaram que, sem o perdão da dívida externa dos países pobres, sem maior fluxo de recursos para essas economias e sem maior acesso a mercados, não há avanço possível.
"O comércio não pode ser encarado como um remédio milagroso para a redução da pobreza. Ele não pode ser desvinculado de ajudas humanitárias e de investimentos estrangeiros diretos", disse à Folha Anwarul Chowdhury, alto representante para os países menos desenvolvidos.
Ao longo das três horas do debate que aconteceu na 11ª Unctad (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento), as intervenções feitas por delegados de Moçambique, Benin e Uganda, por exemplo, também ressaltaram que fóruns como o encontro da Unctad são um importante celeiro de idéias, mas que o desenvolvimento econômico é uma questão urgente e não pode mais ficar restrita a discussões acadêmicas.
"O desenvolvimento é uma questão de vida ou de morte para nós", declarou Samuel Amehou, embaixador do Benin.
Conhecidos como LDCs (sigla em inglês para países menos desenvolvidos), os 50 países que se encaixam nessa definição têm uma renda per capita que não ultrapassa US$ 900. Estima-se que cerca de 50% da população desses países viva abaixo da linha de pobreza -US$ 1 por dia. Em 2015, esse contingente deve atingir 471 milhões de pessoas, diz a ONU.
A maior parte desses países é altamente dependente da exportação de produtos agrícolas primários, o que torna periférica a sua inserção na economia mundial. Diante disso, os representantes dos países pobres traçaram um cenário pouco otimista sobre os benefícios da expansão da liberalização comercial.
Mesmo a integração comercial entre os países em desenvolvimento é vista com ressalvas. "Há o perigo de que os LDCs fiquem tão marginalizados no comércio Sul-Sul quanto eles são no comércio Sul-Norte", afirma trecho de relatório da Unctad sobre esses países.
A preocupação dos LDCs é com a abertura comercial. Hoje, segundo as Nações Unidas, o grau de abertura desses países já é avançado. O nível das tarifas alfandegárias em 42 das 46 economias estudadas é inferior a 25%. Em 29 de 46 países, não há registro de barreiras não-tarifárias, como especificações sanitárias.
"Antes de darmos foco para o comércio, temos que pensar em mudanças de paradigma nas políticas públicas internas dos LDCs", afirmou ontem Charles Gore, economista sênior do Departamento de Países Menos Desenvolvidos da ONU.

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