Desigualdade diminui com renda menor para todos

Chico Santos Do Rio (valor economico)

O mercado de trabalho no primeiro ano de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi marcado por um fato extremamente negativo: uma queda de 7,4% no rendimento médio real, o pior resultado anual desde a queda de 19% registrada em 1990, primeiro ano de governo do ex-presidente Fernando Collor de Mello.

Foi o sétimo ano consecutivo de queda da renda do trabalho, o que já resulta em uma redução acumulada de 18,8% desde 1997. O mau resultado de 2003 foi atenuado pelo fato de a renda dos que ganham mais ter encolhido mais do que a dos que ganham menos. Enquanto a metade da população que ganha mais perdeu 8,1%, a metade que ganha menos perdeu 4,2% segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2003, divulgados ontem pelo IBGE,

Como conseqüência do achatamento desigual, houve uma melhora na distribuição de renda. O Índice de Gini, que mede o grau de desigualdade, passou de 0,563 para 0,555, o que representa um movimento de 1,4% na direção de um maior equilíbrio. O Índice de Gini varia de zero a um. Quanto mais próximo de zero, menor o grau de desigualdade da renda.

"Historicamente, você só teve uma redução da desigualdade em que todo mundo saiu perdendo em 1992, último ano do governo Collor", disse o economista André Urani, diretor do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), ressaltando que aquele era um momento muito diferente, marcado pela instabilidade política e pela hiperinflação.

"Todos que têm preocupação com a pobreza no Brasil devem ficar satisfeitos com a redução da desigualdade. O problema é que quando ela ocorre dessa forma é muito ruim. A idéia é que ela ocorra com crescimento e que os ganhos vão majoritariamente para os que mais precisam", acrescenta Urani.

Segundo a Pnad de 2003, o rendimento médio real das pessoas de 10 anos ou mais de idade ocupadas no Brasil (exceto área rural da região Norte) era de R$ 692 no ano passado, tomando por base a última semana de setembro. Em 2002, o número, corrigido para setembro de 2003 pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), correspondia a R$ 747. Em 1996, esse valor corrigido era de R$ 852. E em 1986 (Plano Cruzado), o valor chegou a R$ 922, o maior número da série divulgada pelo IBGE, que teve início em 1981.

Quando a população ocupada é dividida em faixas de 10%, de acordo com o rendimento recebido, se observa que a remuneração dos 10% mais pobres caiu 8%, de R$ 75 para R$ 69, entre 2002 e 2003, enquanto a dos 10% mais ricos, caiu de R$ 3.444 para R$ 3.134 (9%). A pesquisa revela que houve perda em todos os decis, exceto na faixa entre 20% e 30%, na qual o rendimento passou de R$ 235 para R$ 237 (0,8%).

Para o presidente do IBGE, Eduardo Nunes, "os indicadores (de renda e trabalho) de fato revelam uma redução do desempenho em comparação com o ano anterior", mas ele ressalva que essa redução "foi o preço pago para equilibrar as finanças públicas, reduzir o perigo inflacionário e equacionar o problema da dívida externa". Segundo Nunes, "a opção política do governo foi fazer frente a esses problemas, com o rescaldo aí sobre o emprego e a renda".

Urani também avalia que o governo não tinha alternativa no seu primeiro ano de gestão a não ser enfrentar a crise de confiança que se instalou durante o processo eleitoral de 2002. Então, ele pondera que é necessário esperar por um exame mais de longo prazo. "É preciso ver se durante o purgatório foram criadas as condições para chegar ao paraíso. Em grande medida o dever de casa foi feito, talvez não na intensidade necessária", disse Urani.

Na avaliação do economista, o governo Lula é muito fragmentado e tem uma base política muito diluída para fazer as reformas necessárias à colocação do país no rumo do crescimento sustentado e com melhora na distribuição de renda.

Outro especialista em trabalho e renda, o economista Lauro Ramos, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), é mais crítico quando fala da melhora na distribuição da renda por baixo: "Todo mundo é a favor de melhorar, mas com todo mundo perdendo, não vejo motivo para comemoração. Melhorar, sim, mas não desse jeito", afirmou.

Os dados da Pnad revelam ainda que a renda média das pessoas com qualquer tipo de rendimento (não só do trabalho) caiu mais ainda, passando de R$ 746 para R$ 685 (queda de 8,2%) de 2002 para 2003. Ainda neste formato, o Índice de Gini melhorou de 0,573 para 0,566. Os rendimentos por domicílio caíram 8%, mas também aqui o Índice de Gini melhorou de 0,553 para 0,545.

A Pnad é a mais completa pesquisa anual de dados domiciliares do Brasil. Ela engloba 133 mil domicílios, com 384,8 mil moradores de todas as regiões do país, exceto o Norte rural. Na pesquisa de 2004, que vai a campo a partir de 4 de outubro, a área rural dos Estados do Norte também passará a ser pesquisada.

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